Como eu sempre digo, sem cansar de dizer, a mídia brasileira definitivamente não sabe -- e/ou não quer -- dar importância à música instrumental brasileira nos mesmos moldes com que a mídia americana, por exemplo, dá importância para o jazz -- e aí tem toda aquele papo furado que explica, mas não justifica, e no fim limita nossa música e a empobrece, pois acaba escondendo a arte rica que é nossa música instrumental: "Ahh, no Brasil a música é uma cultura quase que estritamente de expressão oral...blá, blá, blá...". Com raras exceções, a maioria dos "críticos" e jornalistas brasileiros -- falo daqueles mais antenados, alguns desses, inclusive, pseudo-especialistas -- costuma resumir a riqueza musical brasileira (isso quando eles têm algum espaço digno de nota) apenas em uma dúzia de nomes do samba, bossa nova e MPB: exaltam apenas nomes dos quais estamos cansados de ouvir como Tom Jobim, Chico Buarque, João Gilberto, Milton Nascimento, Caetano Veloso...isso, quando alguns deles não apelam pra nostalgia tarimbada de enaltecer o Roberto Carlos jogando rosas para as senhoras na praia de Copacabana, o Zeca Pagodinho numa mesa de bar acompanhado por lindas loiras e garrafas de cerveja, a Ivete Sangalo mandando o galera pular no Ibirapuera...ou nomes mais novos da "nova MPB" como Maria Gadú (arrgh!). Contudo, o multiinstrumentista Hermeto Pascoal, indubitavelmente um dos músicos mais criativos do mundo e de todos os tempos, tem passado por um inegável momento de valorização da sua obra e do seu legado nesses últimos anos -- e isso não seria uma surpresa se não estivéssemos num país que ainda é dividido entre pobres que consomem música descartável e ricos que têm uma mentalidade exteriorizada. Não tem sido poucas as glórias que as novas gerações de instrumentistas e músicos da MPB estão entoando ao grande mestre -- e talvez de olho na possibilidade de parecer "cult" e "sofisticado", um ou outro canal da mídia dominante também tem prestado atenção na arte do "Bruxo dos Sons". Recentemente por exemplo, a Agencia Africa incluiu uma citação honrosa ao mestre num comercial para a Vale do Rio Doce -- e ao ver o comercial em um canal aberto, no horário nobre, perguntei-me: será que o publicitário por detrás do comercial tem uma mente aberta ou algum senso de requinte musical para ter tido a idéia de citar o maior ícone da música instrumental brasileira ou trata-se de uma iniciativa do Governo Lula, um dos então controladores da mineradora, de homenagear nossos ícones? Pendesse pra qualquer um dos dois lados, a resposta seria-me uma surpresa. Sabe-se que em 2010, no Theatro Municipal do Rio, o então presidente Lula parabenizou Hermeto Pascoal e outras 40 personalidades da mídia e cultura brasileira com insígnias da Ordem do Mérito Cultural 2010, prêmio máximo concedido pelo governo federal a personalidades que contribuem para o desenvolvimento da identidade cultural brasileira. Ainda mais recente, nesse mês de junho de 2011, o criador da "Música Universal" fez 75 anos de aniversário, o qual foi comemorado no bairro de Bangu, Rio de Janeiro, onde o mestre morou por muitos anos. Pois bem: o evento não foi tratado com a mesma repercussão de um show da Lady Gaga ou do Rei Robertão, mas teve um ou outro destaque mídia: como, por exemplo, a nota publicada no jornal O Globo, escrita por Arnaldo Bloch. Na tal nota, o jornalista documenta mais um dos exemplos da mediocridade brasileira: a maioria do público presente, inapto para apreciar a arte em seu estado puro, se comportou com zombaria e desrespeito para com o ícone que estava no palco. Irritado, Hermeto destilou sua raiva com aquela simplicidade que lhe é pessoal: "-- Eu dou porrada em vocês, seus filhos da puta. Não sou contra pagode, mas esse pessoal aí só sabe escutar isso." E não foi a primeira vez que Hermeto se deparou com a incapacidade de um público de apreciar sua música. E aí deixo a pergunta: Quem leva a culpa pelo fato do público brasileiro, em sua maioria, ser inapto para apreciar a arte musical em seu estado puro? Abaixo, deixo também dois vídeos que, se analisarmos, são os retratos de dois Brasis: em um vídeo, o mestre vocifera contra um público mal educado, o retrato da ineficiência brasileira em educação; no outro, ele é citado no tal comercial da Vale, onde o nosso país é pintado como um paraíso natural e cultural. Mas mesmo com o governo ineficiente, com a mídia segregalista e com as duras realidades das periferias e suas populações ludibriadas, brademos! Viva a música instrumental brasileira! Feliz Aniversário ao Hermeto! E abaixo à mediocridade! Leia o artigo do O Globo
Bill Laurance and Michael League: Keeping Company
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Bill Laurance is one of the UK's most inventive pianists. His compositions
and arrangements have involved multiple formats, including trios, duos,
orchest...
Há 2 horas
2 comentários:
grande pittá,
hermético, bruxo, mago, mestre...tanto faz que nome que lhe dêem...o sr.hermeto pascoal leva e eleva a música além das fronteiras e conceitos...
nunca me esqueço de um documentário que assisti, super 8 ainda, nos tempos de colégio...ele afirma...compor música é como escrever uma carta...e o vídeo recente com ele musicando a locução de yves montand...???...uau...
salve hermeto pascoal...vida longa a ele e a sua arte
abraçsons
ontem, por uma sorte meio que divina, pude assistir o véio barbudão aqui em Londres. No teatro principal de Barbican Center, todos os assentos vendidos, todo mundo lá pra ver o nosso orgulho cantar na lingua maluca e universal. Por incrivel que pareça, entre ingleses, brasileiros e sei la mais quantas nacionalidades tinha lá ontem (Londres é a capital mundial, mais de 300 linguas são faladas por aqui), Hermeto fez todo mundo cantar com ele, um bucado de som estranho mas que foi lindo e deu muito certo, eu cantei bem alto... Parabéns Hermeto, e sim, burro é quem acha que sua música não é comercial.
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