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Improvisação livre e "improvisação"; improvisadores e "improvisadores"...


Ultimamente o Brasil (mais em São Paulo), tem desenvolvido um pequeno circuito de música mais ousada, conhecida como Free Improvisation, às vezes ligadas ao Free Jazz. Ainda é um espaço microscópico, mesmo dentro do circuito cultural metropolitano, mas já desenvolveu um intercâmbio com grandes músicos do cenário mundial como: Phil Minton, Veryan Weston, Mark Sanders, Trevor Watts, Hans Koch, sem contar que recentemente já passaram por aqui, Peter Brötzmann, Han Bennink e Michael Moore (numa situação bizarra com a Mantiqueira?!), Art Ensemble Of Chicago, etc.

Alguns grupos e músicos individuais iniciaram seus trabalhos com muita dificuldade no início da década de 2000 e continuam lutando para manter viva esta música. O grupo Abaetetuba foi o pioneiro na improvisação livre coletiva  aqui em solo tupiniquim e músicos como o brasileiro Marcio Mattos (radicado na Inglaterra) e o suiço Thomas Rohrer participaram deste projeto, que surgiu dos encontros de Antonio Panda Gianfratti e Yedo Gibson (na foto abaixo com a banda holandesa Eke). Após essa contribuição, porém, a maioria de seus membros está "exilada" na Europa: Rodrigo Montoya faz parte da London Improvisers Orchestra e outros projetos, Yedo Gibson e Renato Ferreira na Holanda com a Royal Improvisers Orchestra e outros projetos e já possuem o reconhecimento de seus talentos e arduo trabalho e dedicação à música no seu estado mais puro como arte.





Mas essas contribuições não foram em vão: verdadeiramente, tem surgido, nesta metrópole totalmente desordenada e cheia de paradoxos, uma nova geração de músicos interessados em Free Jazz e Free Improvisation, assim como tem surgido um pequeno e até significativo público interessado. Poucos são os meios de divulgação e informação em termos de mídia disponíveis em São Paulo, e se não fosse o ilimitado acesso da world wide web, que possibilita todo o tipo de informação e intercâmbio com o cenário mundial destes estilos musicais, estariamos em uma situação miserável em termos de cultura. Aliás, mesmo na internet, os meios mais acessados de informação, inclusive digital, pecam no conhecimento mais abrangente em relação a música livre, de modo que ainda vemos pessoas emitindo informações cheias de equívocos e opiniões pessoais que não deveriam ultrapassar as conversas informais com amigos.


Até o circuito de música independente, que teve seu apogeu nos anos 90 com o fenômeno artificial e sintético do Grunge, é até hoje amorfo, prostituido de seus ideais (se é que ainda existe algum ideal no sentido mais poético). Então, por essa precariedade do circuito underground, o Free Jazz e a Free Improvisation -- os quais acabam circulando pelos mesmos espaços -- chegam a ser deturpados quanto aos seus reais propósitos artísticos e suas estéticas. Não que essa difusão limitada ao underground seja negativa: o problema reside num outro problema social e abrangente que remete à raiz educacional e cultural deste país. É por causa disso que o  improviso acaba ganhando um sinônimo de despreparo, sendo que estes estilos musicais são justamente o contrário disso: ou seja, o verdadeiro improvisador, tanto da Free Improvisation e o Free Jazz precisam ter à mão, um vocabulário desenvolvido e um domínio razoável de suas ferramentas, e isso não quer dizer de maneira nenhuma que o músico tenha que ser um prodígio de seu instrumento. Então, as vezes até encontramos alguns músicos que tem acesso sobre o assunto, mas na prática, estão longe de se enquadrarem no perfil do verdadeiro improvisador. Muitos deles conhecem nomes, gravações de artístas fundamentais, mas isso não os habilita como improvisadores. Como a maioria do público interessando em música improvisada é formada de leigos, mas abertos à uma sonoridade mais inusitada, ainda não desenvolveram a percepção o suficiente para detectarem se uma peça improvisada foi bem sucedida ou não -- essa percepção é algo que se desenvolve com o tempo.

Enfim, um grande emaranhado de noise e clusters, performances meramente estéticas podem impressionar o novato público. Mas a peça de improvisação possui início, desenvolvimento e conclusão de uma idéia criada naquele instante, contando com o repertório e a bagagem pessoal de cada envolvido. É obviamente equivalente a uma conversa entre pessoas sobre determinado assunto, sendo que cada participante necessita estar ao par do assunto, conhecê-lo, para desenvolver o debate, expor suas impressões e a conversa se concluir. Caso contrário, é similar a um bate-papo de ébrios na mesa de um bar, só como pretexto entre as doses ingeridas e o estado de consciência não exige um contexto que se conclua e faça um sentido lógico.

 
Aos que estão interessados em desfrutar deste estilo musical no seu estado mais puro e livre em termos de arte, tanto como ouvinte ou músico, aproveite o fácil acesso à informação na midia digital, reflita nas reportagens e entrevistas dos musicos que já possuem um histórico neste campo, ouçam e comparem as performances e logo identificarão as características distintas entre este aparente emaranhado de notas e sons. É como um verdadeiro enólogo ou sommelier (sem pré-conceitos de gênero, é apenas uma comparação), que sabe distinguir as suaves diferenças entre as safras de uvas, sabor, qualidade de um vinho. Só que na música, não é recomendada a moderação na quantidade de doses, pois quanto mais, melhor se apura, ao contrário do vinho que quanto mais doses, diminui a percepção. Contudo, para o caso dos iniciantes, apreciem com moderação.


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