CARLOS CALADO
Colaboração para a Folha de S.Paulo

"Só me lembro de que já era muito tarde e eu estava exausta. Devo ter errado bastante naquela noite", diz à Folha a compositora e pianista norte-americana Carla Bley, 70, atração escalada para o Tim Festival (dia 22/10, em São Paulo; 24/ 10, no Rio de Janeiro; e 25/10, em Vitória).
Se estivessem prestes a se apresentar no país, como ela, outros artistas se apressariam em dizer o quanto adoram a música brasileira, mas a idiossincrática miss Bley --sobrenome de seu primeiro marido, o pianista Paul Bley, que manteve apesar de terem se separado em 1967-- é capaz de dar respostas tão inusitadas quanto suas composições.
"Não tenho lembranças musicais daquela turnê, exceto de que foi meu último concerto em duo. Mas me recordo de ter ido a um grande mercado, onde comprei cinco tipos de feijão e mangas incríveis.
Naquela época, eu estava muito interessada em comida e me deliciei provando diversas frutas", diz. Agora miss Bley virá com seu quinteto, o Lost Chords, que inclui Steve Swallow (baixo), Billy Drummond (bateria), Andy Sheppard (sax tenor) e Michael Rodriguez (trompete).
"O repertório desse concerto vai sair de nossos dois álbuns. Talvez eu toque algo inédito e alguma composição mais antiga", adianta. Desde o início de sua trajetória, nos anos 60, o nome dessa irreverente compositora esteve associado ao jazz de vanguarda de músicos, como o saxofonista Steve Lacy ou o baixista Charlie Haden.
Não é à toa que ela ainda escreve arranjos para a Liberation Music Orchestra (banda criada por Haden, em 1969, com um repertório de canções de protesto e hinos revolucionários), que foi reativada, em 2004, como reação ao belicismo do governo Bush.
Miss Bley conta que a orquestra tem realizado concertos com renda revertida para a campanha do candidato democrata Barack Obama à presidência dos EUA, embora ela própria não tenha muita fé no poder militante de sua música. "Charlie [Haden] acredita nisso, mas eu sou meio cética, duvido que isso seja possível.
Sinto que só os eleitores já decididos a votar em Obama vão nos ouvir, num clube de jazz. Mas fazer algo assim leva você a se sentir melhor. Como não temos dinheiro, isso é o que podemos oferecer à campanha." Ainda assim, ela também duvida da possibilidade de Obama virar o jogo político no país.
"Não sei se ele vai conseguir encarar um jogo tão pesado, porque ele é inteligente demais para isso. Nos EUA, um candidato precisa fazer coisas estúpidas para conseguir o apoio das pessoas mais estúpidas." Com essa mesma acidez, ela encara o panorama atual do jazz. "Sem dúvida, a cena de hoje é muito mais conservadora do que a da década de 50 ou a de 60.
Eu ainda não fazia parte do mundo musical nos anos 50, outro grande período, mas tive sorte de já estar presente na década de 60, a mais excitante de todos os tempos."
Pianista grava álbum de Natal
Habituada a gravar e tocar composições próprias ou dos músicos de sua banda, a jazzista Carla Bley prepara uma surpresa de final de ano para os apreciadores de sua música: um álbum de Natal.
"Já estou trabalhando nos arranjos, com Steve Swallow e um quinteto de metais. Vamos gravar antigas canções de Natal, como "Noite Feliz" e "Jingle Bells", que serão adaptadas ao meu estilo", revela a pianista e arranjadora norte-americana. Papai Noel e suas renas que se cuidem...
Carla Bley no Tim Festival
Quando: dia 22, às 20h30
Onde: auditório Ibirapuera (av. Pedro Álvares Cabral, s/nº, portão 2, pq. Ibirapuera, São Paulo; tel. 0/xx/11/6846-6000)
Quanto: R$ 150 (ingressos esgotados)
Classificação indicativa: não recomendado para menores de 18 anos
Nenhum comentário:
Postar um comentário