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Finlândia e seus vikings contemporâneos: Värttinä, Apocalyptica e o compositor erudito Magnus Lindberg!


Não sei o porquê, mas todas as vezes que penso em Finlândia e noutros países escandinavos, minha imaginação cria umas imagens relacionadas a gelo, lagos negros com cisnes brancos, vinkings com tranças nas barbas, elfos com imagens angelicais, pessoas loiras, ruivas, pálidas e de alta estatura, Império Soviético e etc (rs). A propósito, o que a Finlândia tem em comum com o Brasil em relação a música? Resposta: nada, além do fato de que somos resumidos e lembrados através de um único nome de grande peso histórico em relação à música erudita -- o grande gênio e nacionalista Heitor Villa-Lobos --, e a música erudita da Finlândia, país nórdico e ex-colônia do Império Soviético, também é resumida por um único nome de grande peso histórico e universalmente conhecido: o compositor Jean Sibélius, também um gênio e nacionalista, um dos heróis mais adorados pelos finlandeses (vide a foto ao lado, na qual o compositor foi homenageado com sua imagem em uma das cédulas do dinheiro finlandês). Ademais, aqui no Brasil pouco se conhece sobre a música finlandesa: por se tratar de um país um tanto distante em termos de cultura e geografia, poucos de nós brasileiros saberíamos produzir uma lista de bandas, músicos e compositores desse país -- é mais fácil os finlandeses conhecer nossa já manjada música vocal, nosso Tom Jobim, nosso Chico Buarque, nossa Elis Regina, nossa Marisa Monte e etc..., do que nós conhecermos algum músico, alguma banda ou algum compositor da Finlândia. Mas trata-se, sim, de um país que é uma fonte rica de música bela, criativa, exótica e enérgica -- e é uma fonte rica e excelente em vários estilos de música. Em meus anos de adolescência, quando estava iniciando nos estudos do violino, eu me recordo de um amigo violoncelista -- que tragicamente se suicidaria na Paraíba, pulando do prédio em que morava -- me impressionar com um CD do Apocalyptica, célebre e excelente trio finlandês de violoncelos representante de um estilo de rock instrumental conhecido como "symphonic metal", estilo marcado pelos entrelaces entre o rock pesado e a música erudita -- e lembro, ainda, que este mesmo amigo também curtia a banda Stratovarius, outra legenda do rock nórdico. Há alguns anos atrás eu também fiquei impressionado quando conheci a música exótica e emocionante do Värtinnä, outro excelente grupo musical da Finlândia, mas esse baseado numa música vocal que mescla pop com elementos folclóricos do país -- o grupo inclusive chegou a trabalhar com o famoso compositor indiano A.S. Rahman na trilha do emblemático filme Senhor dos Anéis, adaptação do conto escrito pelo filólogo inglês J.R.R. Tolkien, um verdadeiro mestre das fantasias e um fanático pelas mitologias nórdicas e germânicas. Depois de me impressionar com o melodismo da música romântica de Sibélius -- do qual sou apaixonado pelo conhecidíssimo Concerto em Ré Menor para Violino --, com o enérgico rock instrumental do Apocalyptica e com as misturas de pop e a música folclórica nórdica do Värtinnä, as minhas mais recentes descobertas em relação à música finlandesa giraram em torno de pesquisas sobre Esa-Pekka Salonen, compositor e regente que, da década de 80 até meados dos anos 2000, empunhou uma verdadeira revolução de abordagem e estética musical na Orquestra Filarmônica de Los Angeles, com a qual gravou várias obras do repertório contemporâneo. Acabei descobrindo, portanto, que a Finlândia não só valoriza a música erudita nos mesmos patamares de investimento de países como Alemanha e Inglaterra, como também está na vanguarda da música contemporânea -- e o fato do país ter apenas Sibélius como seu único compositor universalmente conhecido limitava um pouco minha compreensão em relação a sua contribuição ao universo da música.




1.Trecho de "Action-Situation-Signification"/ 2. Duo Concertante (Magnus Lindberg)

E foi pesquisando sobre Esa-Pekka Salonen -- figura da qual falarei mais abrangentemente num outro post -- que descobri outro seminal e importante compositor finlandês: o prolífico Magnus Lindberg. Nascido em Helsinque, em 27 de junho de 1958, Lindberg formou-se em música pela Academia Sibélius -- o grande centro de estudo musicais e celeiro de jovens talentos da Finlândia -- e, num dos famosos cursos de verão em Darmstadt (Alemanha), chegou a receber instruções do seminal Brian Ferneyhough, compositor conhecido por ser expoente do movimento musical denominado "Nova Complexidade", o qual, como o próprio nome sugere, tem suas bases em uma construção rítmica, harmônica e melódica elevada ao extremo da elaboração técnica: polirritmia, uso de quiálteras que desafiam o sendo rítmico e interpretativo do músico, microtonalidade, dissonância, atonalidade, instrumentos preparados e inusuais -- e, claro, para expor tudo isso escrito na pauta, os compositores adeptos a essa vertente fazem o uso de uma notação musical um tanto inusitada e complexa. Mas influências de Lindberg ainda englobariam muitas outras manifestações musicais: inicialmente adepto à música concreta e ao punk rock, o compositor também se deixou influenciar pelos estudos de música serial e eletroacústica de Pierre Boulez e Stockhausen, pelo estilo de orquestração e rítmica de Stravinsky, pelas técnicas do minimalismo americano, pela música espectral de Tristan Murail e pela livre improvisação do compositor Vinko Globokar. Porém, a cronologia das obras lançadas por Lindberg mostra que ele não apenas condensou essas técnicas musicais a partir dos anos 80, mas rumou gradativamente de um estilo intrincado, marcado pelo uso de manipulação eletrônica e atonalidade -- vide as emblemáticas peças Action-Situation-Signification (1982) e Kraft (1983-85) --, para um estilo mais consoante com a "nova tonalidade" da música contemporânea -- vide seus concertos para violoncelo (1999), clarinete (2002) e violino (2006) -- , fase essa onde ele deixa de lado aspectos vanguardistas do século passado para trabalhar em prol de um novo brilhantismo e exuberância orquestral -- uma tendência que, afinal, foi adotada pela maioria dos antigos adeptos às vanguardas relacionadas ao dodecafonismo e ao serialismo integral, para citar apenas as duas principais transformações passadas. Com essa atitude, o compositor, que já vinha sendo automaticamente reconhecido mesmo em suas obras mais atonais, agora está em fase de um reconhecimento ainda mais midiático. Não obstante, nos últimos anos, a partir de 2009, Magnus Lindberg foi preterido para ser o compositor residente da Filarmônica de Nova Iorque e já foi contratado para escrever peças para grandes orquestras como a Filarmônica de Berlim, de Simon Rattle, e a San Francisco Symphony.


"Clarinet Concerto" (Magnus Lindberg)

Para quem é adepto à música moderna e contemporânea -- e tem um cartão de crédito disponível para compras na internet --, há alguns álbuns de Magnus Lindberg que estão disponíveis nos sites da Amazon e da CD Universe e merecem atenção. Ainda no início anos 80, Lindberg fundou um experimental conjunto de câmara chamado Toimii Ensemble, para o qual escreveu/ elaborou as peças "Action-Situation-Signification" e "Kraft", suas primeiras obras-primas. Constituído por jovens recém-formados da Academia Sibélius, o Toimii Ensemble originou-se de uma formação camerística iconoclasta e foi assim formado para ser uma espécie de "laboratório musical", onde os músicos e compositores pudessem expressar suas influências (muito forte não apenas na música erudita de vanguarda, mas também no free jazz, heavy metal e punk rock) e experimentar diferentes entrelaces e sonoridades entre a estruturação da música serial e concreta com a livre improvisação: o ensemble foi formado inicialmente por Lassi Erkkila (percussão), Kari Kriikku (clarinete), Anssi Karttunen (violoncelo), Timo Korhonen (guitarra, a partir de 1989), Juhani Liimatainen (eletroacústica), Magnus Lindberg (piano), Riku Niemi (percussão, a partir de 1989) e o maestro Esa-Pekka Salonen, que seria, aliás, um dos grandes responsáveis por promover as obras de Lindberg. A peça "Kraft", escrita entre 1983 e 1985 para a interação do Toimii Ensemble com orquestra sinfônica, pode ser encontrada nos sites de compra on-line em dois registros: o primeiro, gravado em 1996 e lançado pelo selo Finlandia, com Esa-Pekka Salonen à frente da Swedish Radio Symphony Orchestra (Orquestra Sinfônica da Radio Sueca), também traz a impactante peça de música concreta com livre improvisação "Action-Situation-Signification"; já o segundo, gravado em 2004 e lançado pelo selo Ondine, com Esa-Pekka Salonen à frente da Finnish Radio Symphony Orchestra (Orquestra Sinfônica da Radio Finlandesa), faz um contraste desta peça com o "Piano Concerto" (1991-93), uma peça onde a linguagem pessoal do compositor está menos cacofônica e atonal e mais consoante com a melodiosidade da "nova tonalidade". Para quem quer ouvir outras obras relacionadas a este selvagem momento de criatividade do então jovem Magnus Lindberg dos anos 80 e início dos anos 90, há, ainda, o registro do Ensemble InterContemporain, gravado em 1999 para a série de álbums dedicados a compositores contemporâneos chamada "Compositeurs D'aujourd'hui", o qual traz as peças "UR" (for 5 players & electronics), "Corrente" (Pour Ensemble), "Duo concertante" (for clarinet, cello & ensemble) e "Joy" (for ensemble & electronics) -- essas peças, aliás, já mostram indícios do gradual refinamento pelo qual o compositor começou a se submeter ao migrar do seu estilo inicial, marcado por uma música concreta, pontilhista, cacofônica, atonal, com manipulação eletrônica e, às vezes, até livremente improvisada, para um estilo marcado por harmonias e melodias mais densas, orquestrações mais exuberantes e elaboradas. Mas para quem gosta de música contemporânea mas não é afeito à cacofonias, mas sim por orquestrações com características do "neo-clássico" e/ou "neo-romântico" -- o "clássicismo contemporâneo", por assim dizer --, indico trêz registros que refletem seu estilo atual, menos selvagem e mais sóbrio, ainda que muito inusitado e exuberante: o primeiro é o álbum lançado pela Sony Classics em 2002, o qual traz as estréias das peças "Cantigas", "Cello Concerto", "Parada" e Fresco", todas regidas por Salonen à frente da London Philharmonia Orchestra; o segundo é o registro, também lançado pela Sony Classics em 2007, que traz um contraste entre o Concerto para Violino em Ré Menor de Sibélius com o "Violin Concerto" de Lindberg: a interpreção é da violinista georgiana Lisa Batiashvili com a Finnish Radio Symphony Orchestra; o terceiro, também com a Finnish Radio Symphony Orchestra e lançado pelo selo Ondine, traz o fantástico "Clarinet Concerto" -- sua obra mais popular, dentre as mais atuais --, além das peças "Gran Duo" e "Chorale". Para comprar os álbuns citados e/ou saber de mais informações, clique sobre as imagens acima e abaixo. Boa viagem!!!

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