Um post sobre música erudita, e ainda falando de Zappa, no Farofa Moderna? Um post só, não! Dois! Leiam este e o segundo post que está logo abaixo. Sim, isso mesmo meus caros: Zappa teve muito a ver com o jazz (principalmente com o jazz fusion) e ainda mais a ver com a música erudita. E é o seguinte: agora, aqui no blog, volta e meia também estarei explicitando alguns 'pitacos' pessoais sobre música erudita moderna e contemporânea, ou seja, música erudita do século XX e XXI – pois eu acho, se não me engano comigo mesmo, que, após algumas dezenas de audições repetidas, já me sinto à vontade para começar por à prova algumas das minhas impressões e análises sobre alguns compositores e algumas obras do universo erudito, universo que passei a amar inveteradamente, mas no qual transito com um certo cuidado e paciência: ou seja, como passei a pesquisar música de vanguarda e música contemporânea muito recentemente (à mais ou menos uns três anos atrás, muito em decorrência das minhas audições jazzísticas), tenho o cuidado de nunca fazer análises sobre algum compositor sem tê-lo ouvido bastante vezes e com largos períodos entre as audições, isso afim de suplantar certos achismos (apesar de fortalecer outros) e reafirmar certas sensações, emoções e impressões os quais me são inerentes a cada vez que ouço uma obra. Mas já adianto: o grande desafio – e vocês, leitores, devem reparar e exigir isso tanto em meus textos quanto nos textos que lêem por aí, em outros canais – é falar de música erudita moderna e contemporânea expurgando todo o excesso de conceitualismo com o qual este gênero musical se engordurou durante a história: é aquela coisa de um crítico escrever sobre John Cage e ficar metade da resenha exaltando sua obra “4:33”, uma suposta “peça” inteiramente silenciosa (supostamente “escrita”, e para piano!), como “uma peça das mais revolucionárias da história da música porque trouxe o uso do silêncio para a reflexão acerca do que pode ser ou não ser considerado música, blá, blá, blá, blá, blá”... Ora, pode ser que o que eu venha a dizer em seguida seja mais um dos meus achismos, mas, pra mim, essas fundamentações conceituais são um tanto pedantes: parece que compositores experimentais como, por exemplo, Morton Feldman e John Cage, por terem sido controversos e quase que somente experimentalistas, sempre estarão dependentes de longas e pedantes conceitualizações que venham justificar suas criações e venham cobrar , de forma até forçada, que o público compreenda a musicalidade e a criatividade deles – e aí, há sempre aquele tom apoteótico na narrativa do crítico ou resenhísta, principalmente quando ele exalta as peripécias dos compositores mais do que suas próprias obras. Mas para mim, a música genial, a obra genial, não precisa ser sempre relacionada às peripécias do seu criador para entendermos o quanto ela é genial; pra mim, a música genial é aquela que fala por si só: ela explicita, por si só, não só a personalidade e a genialidade do artista, mas também mexe, por si só, com nossa imaginação, nos transmite idéias, sensações e emoções sem precisarmos nos inteirar de uma determinada bula conceitual, às vezes nos imposta “goela abaixo” pelo próprio compositor ou por seus conceitualistas simpatizantes. Isto é, apesar de eu achar que foi natural e necessário o fato da música erudita ter chegado à uma vanguarda totalmente conceitual e experimentalista nos anos 50, 60 e 70, não me simpatizo com composições puramente conceituais e experimentais – aquelas do tipo que mostra apenas a experimentação pela experimentação, algumas até anti-musicais e puramente polêmicas. Aliás, tenho pra mim que se não fosse o cinema moderno – que passou a usar muita música vanguardista em seus filmes de terror, ficção científica e suspense psicológico e afins – boa parte do repertório do século XX – com suas composições abstratas, guturais, pontilhistas e conceituais em torno da cacofonia e serialismo integral – seria incapaz de trazer uma mensagem clara ao ouvinte somente pelas vias do som: ou seja, é indelével que o cinema, enquanto arte da imagem em movimento, tenha proporcionado um campo fértil para essa tal música do ruído. Por um lado, essa associação de som e imagem proporcionou avanços sem precedentes na história da arte, inovando não só o cinema, mas outras vertentes do audiovisual. Por outro lado, tenho a impressão de que a música criativa nunca mais pôde falar por sí mesma: as pessoas tendem a achar que a música desse tipo é relevante apenas para dar vida à imagem, que ela é uma arte menor, um objeto para o uso do cinema, uma arte que, se não estiver atrelada à imagem, à escrita ou à fala, não tem vida própria, não tem a capacidade de, por si só, passar grandes mensagens...
Começo, então, a falar algo de música erudita aqui no blog através da minha curiosidade às obras do guitarrista, compositor, e dentre outros ofícios, diretor de cinema Frank Zappa (1940-1993), este também um polêmico, um ácido, um cômico, um autodidata, um irreverente artista e ser humano, mas genial e claro em algumas das suas idéias. Não, não...como já disse, não sou afeito a falar de peripécias, pois acho que elas devem ter apenas um papel ilustrativo dentro da biografia de um artista que deu tantas contribuições concretas à música ou qualquer outra forma de arte! Ora, se eu fosse falar aqui de todas as peripécias de Zappa, além das suas facetas musicais – suas letras ácidas e críticas contra a censura, suas polêmicas, suas poses (seu egocentrismo), criações, lendas, brigas, verdades que ele dizia e ninguém gostava e até bobagens já ditas por ele também – eu acabaria escrevendo um livro biográfico só com suas presepadas e deixaria sua música, o que realmente interessa aqui, em segundo plano: só para se ter uma idéia, o famigerado bigodudo não só influenciou como também enfureceu em muito os Beatles (em 1968, Paul McCartney chegou a tentar impedir o lançamento do seu álbum We're Only In It For The Money, uma paródia ao álbum Sgt Pepper's e uma sátira ao movimento hippie Flower Power da época); flertou com o jazz, com o fusion e com a livre improvisação (chegou a tocar, inclusive, com alguns jazzistas como Gary Burton e Roland Kirk, além de impulsionar o violinista Jean-Luc Ponty ao sucesso); empreendeu-se na política americana e até tentou emplacar sua polêmica candidatura para a presidência dos EUA (feito dantes conseguido por Dizzy Gillespie!); participou de filmes e séries televisivas (fez, por exemplo, uma pontinha na série Miami Vice, iniciada em 1984, por exemplo); e, por fim, ainda conseguiu emplacar seu nome como um proeminente compositor de música erudita contemporânea entre meados dos anos 80 e início dos anos 90, tendo até uma considerável repercussão através das suas gravações com o maestro americano Kent Nagano e sua parceria com o compositor e maestro francês Pierre Boulez, considerado uma lenda do conceitualismo vanguardista que ditou os rumos da música erudita dos anos 40 aos anos 70. Falando estritamente de música, fica até difícil de imaginar o quanto Zappa já teria realizado como compositor se ele não tivesse morrido (de cancêr da próstata), em 1993...
Mas antes de mais nada, é preciso salientar, aos incrédulos, o seguinte: o roqueiro Frank Zappa, em sua faceta erudita, não se ateve apenas ao simples exercício de juntar uma banda de rock com uma orquestra sinfônica – ele foi, de fato, um grande compositor; ele escreveu, de fato, música erudita crua e nua, com toda a sustância e todos os rigores estéticos e técnicos inerentes à arte. Os esforços que Zappa empreendeu em favor da sua paixão pela música erudita de vanguarda começaram já entre o final dos anos 60 e meados dos anos 70: em 1968 ele lançou, por exemplo, o álbum Lumpy Gravy (gravado junto com uma orquestra chamada Abnuceals Emuukha Electric Symphony Orchestra), um registro pioneiro do estilo collage in music, com influências da música concreta, colagens de recortes orquestrais, manipulações elétricas e eletrônicas, palavras faladas e canções de teor pop. Mas, apesar de todos seus esforços, pode-se dizer que Zappa apenas conseguiu com que algumas portas fossem abertas para que algumas de suas composições começassem a ser apreciadas em meados dos anos 80, não significando que toda sua obra escrita para concerto e para conjuntos de câmera fosse, já a partir deste momento, definitivamente aceita dentro do repertório contemporâneo do século XX – ou seja, ainda hoje trata-se de um repertório que precisa ser analisado, aceito e popularizado pelos grandes maestros da atualidade e dos últimos anos; trata-se de um repertório que ainda precisar ser posto à prova do público atual. Mas Zappa, autodidata sem graduação acadêmica e sem mestrado em composição, também tinha noção que boa parte do seu sucesso mediante os especialistas – críticos, regentes e compositores – advinha não só do fato dele ser um compositor talentoso, mas, a príncípio, adveio do inerente fato dele ser um rock star que enaltecia a vanguarda desde o início do seu estrelato, o que também, por outro lado, não era bem visto pelos conservadores: apesar do reconhecimento de alguns dos mais geniais e mais progressistas maestros e compositores, Zappa deixou suas frustrações patentes nas entrevistas dadas em seus últimos anos de vida, criticando, justamente, a burocracia do mercado fonográfico ligado à música erudita e, consequentemente, a dificuldade que ele tinha de se auto-afirmar definitivamente como um compositor de música erudita contemporânea, sua grande ambição. Amante, desde a adolescência, de compositores vanguardistas como Stravinsky, Edgar Varèse, Webern e Kagel, Zappa não apreciava o melodismo convencional da música clássica e romântica (ele achava Mozart, por exemplo, muito mecânico, muito bem “marcadinho”, um porre! ), e ainda colocava num mesmo patamar de igualdade tanto as dificílimas cadências de um concerto erudito ou as intricadas frases jazzísticas de um saxofone quanto os solos virtuosos de uma guitarra psicodélica – e era essa postura, dentre tantas outras, que, segundo ele próprio, intrigava seus críticos e algumas pessoas conservadoras da música erudita, como quem dizia: “Quem esse roqueiro maluco pensa que é pra querer ser levado a sério como um compositor de música erudita? Mas ainda assim, Zappa transcendeu esses limites e difculdades.
Um dos primeiros gigantes da música erudita a se associar com Frank Zappa foi o brilhante regente indiano Zubin Mehta, na época recém empossado diretor-artístico da Filarmônica de Los Angeles: era Maio de 1970 quando ele e o regente tiveram a idéia de produzir um concerto unindo sua banda de rock com a orquestra de Los Angeles, tocando um repertório que, segundo ele mesmo, escrevera nos quartos dos hotéis por onde sua legendária banda Mothers of Invention passava – a empreitada foi muito bem sucedida mediante a crítica especializada, mas frustrou suas expectativas, que era, dentre outras, realizar uma gravação ao vivo do concerto, algo que não aconteceu por falta de consenso acerca dos direitos e pelo fato de que, se fosse pra acontecer, ele teria de bancar todos os custos do projeto. Após este célebre acontecimento, Zappa adentraria à sua fase setentista. Antes, ele ainda sofreria um acidente no Teatro Rainbow, em 1971, em Londres – o que lhe rendeu algumas fraturas, um trauma na cabeça, ferimentos costas, pernas e pescoço, problemas na laringe (o que fez com que sua voz descesse uma terça abaixo), além do uso da cadeira de rodas. Após a recuperação, Zappa deixaria de trabalhar com os Mothers e passaria a trabalhar com grupos e bandas mais instrumentais, deixando evidente a influência do jazz vigente em sua nova fase: tanto que, em certa medida, pode-se dizer que Zappa também foi um músico ligado ao movimento do fusion (ou jazz-rock), iniciado por Miles Davis em 1969 – são desta fase setentista ao menos quatro LPs fortemente influenciados por esta estética jazzística: Waka/Jawaka (1971) , The Grand Wazoo (1972) os os álbuns Roxy & Elsewhere (1974) e One Size Fits All (1975), que são reconhecidos por conter temas complicados tais como "Inca Roads", "Echidna's Arf (Of You)" e "Be-Bop Tango (Of the Old Jazzmen's Church)" . Já estabelecendo-se como um artista independente e mesclando-se entre ser guitarrista, compositor, arranjador, produtor e vocalista, Zappa sempre prezava por contratar músicos com alguma qualidade técnica para dar vazão aos seus temas primorosos, nos quais ele misturava canções de rock, improvisos jazzísticos e/ou improvisos livres e caóticos, sacadas bem elaborada em torno dos timbres acústicos e psicodélicos, bem como arranjos orquestrais e até o uso de big bands: algumas das suas formações instrumentais dessa época eram constituídas de músicos tais como Ian Underwood (palheta, teclados), Ruth Underwood (vibrafone, marimba), Sal Marquez (trompete, vocais), Napoleon Murphy Brock (saxofone, flauta e vocais), Bruce Fowler(trombone), Tom Fowler (baixo), Chester Thompson (bateria), Ralph Humphrey (bateria), George Duke (teclados, vocais) e Jean-Luc Ponty(violino), dentre outros músicos do rock e do jazz. É nessa fase que Zappa também encontra seu grande parceiro Captain Beefheart (morto em dezembro de 2010), um dos únicos grandes criadores do rock experimental a lançar um trabalho da mesma espécie e grandeza que o seu. Zappa terminaria essa fase com grande sucesso na mídia, com grande sucesso de vendas – sendo incluído constantemente em posições privilegiadas nos rankings da Billboard, por exemplo – e, enfim, determinado a se desprender totalmente das gravadoras, alcançando, em seguida, grande sucesso como produtor e empresário independente. Logo após essa fase, Zappa novamente seria lembrado nos meandros do universo da música erudita, só que agora ele seria lembrado com mais ênfase como um compositor proeminente: em 1983, o célebre e jovem maestro Kent Nagano gravou algumas das suas inéditas peças para orquestra à frente da Orquestra Sinfônica de Londres, gravação essa registrada no álbum London Symphony Orchestra Vol.1, lançado neste mesmo ano, e London Symphony, Vol. 2, que só seria lançado em 1987; ainda em 1983, Zubin Mehta voltaria a se lembrar dele, colocando algumas de suas obras no programa “Música do Século XX” na grade da Filarmônica de Nova Iorque, ao lado de outros grandes compositores como Schoenberg, Alban Berg, Stravinsky, dentre outros; por fim, em 1984, foi a vez de ninguém menos que o exigente vanguardista Pierre Boulez, já célebre regente e já reconhecidíssimo compositor, gravar o álbum Boulez conducts Zappa: A Perfect Stranger com seu legendário Ensemble InterContemporain – trata-se de uma compilação de três peças encomendadas pelo regente mais quatro peças executadas pelo próprio Zappa ao synclavier, pioneiro sintetizador usado por compositores relacionados à música eletroacústica e pelos experimentalistas e fusionistas afins. Precisava mais? Não! Com esses acontecimentos, Zappa entraria, enfim, para o repertório do século XX, só não vindo a ter êxito ainda maior por causa da sua precoce morte em 1993, aos 53 anos de idade. Ouça abaixo, uma peça do álbum Ensemble Modern Plays Frank Zappa: Greggery Peccary & Other Persuasions (vide resenha do post abaixo deste)
Put A Motor In Yourself - Frank ZappaLonge de ser um compositor atrelado às tendências americanas do minimalismo e do neo-tradicionalismo, iniciadas respectivamente nos anos 70 e 80, Zappa foi levado mais a sério (como um excelente compositor erudito) na Europa do que nos EUA. Numa síntese estrita à sua escalada ao reino dos grandes compositores do século XX é sabido que, ao contrário da sua prepotência no mundo do rock, Zappa não surgiu na música erudita para se autoproclamar inovador, mas sim para enaltecer suas influências (Varèse, em especial) e para somar-se ao cast de compositores criativos pós serialismo integral, haja vista muito antes dele surgir como um compositor proeminente, a música ocidental já havia passado pelas mais variadas espécies de arranjos e experimentações – e ele não só tinha profundo respeito pelos mestres inovadores de outrora como também tinha noção do grande caminho que ainda precisaria percorrer e do quanto ainda precisaria mostrar para se tornar tão grande quanto eles. Talvez, então, não seja certo dizer que Zappa será sempre lembrado como um compositor com a representatividade de um Stravinsky ou mesmo de um Charles Ives, para citar um compositor norte-americano – aliás, seria um exagero equipará-lo a compositores que foram verdadeiros “divisores de água" da história da música. Mas é totalmente certo dizer que Zappa, um gênio!, já pode ser considerado um compositor inserido no repertório do século XX – mesmo que suas obras tenham sido pouquíssimas vezes executadas e não tenham sido ostensivamente gravadas – porque, em geral, o repertório vanguardista e contemporâneo é mesmo pouco executado –, mas só os fatos delas terem sido analisadas e regidas por panteões da composição e regência como Nagano, Mehta e Boulez já o credencia como um grande compositor. (Falando-se em contribuição para a música em geral, não há o que contestar: Zappa foi um grande inovador do rock'n'roll e, muito além disso, executou fusões geniais e emblemáticas que transcendem a compreensão dos conservadores, puristas e xiitas. Com um espírito sempre autodidata e uma grande compreensão de arranjo, composição e improvisação, Zappa elevou o rock ao mesmo patamar de liberdade que o jazz e ao mesmo patamar de arranjo e rigor estético que a música erudita). Agora, seguindo os exemplos de Mehta, Nagano e Boulez, seria interessante e revelador se os grandes mecenas do reino musical e os grandes maestros por detrás das grandes orquestras tocassem não só outras obras inéditas de Zappa, mas investissem mais ativamente em novos compositores e novos repertórios...Com todo respeito aos "Deuses" imortais da música como Mozart, Beethoven, Wagner e vários outros mestres das sonatas, sinfonias, suites e óperas que ainda são dominantes nos programas anuais das grandes orquestras do mundo, mas as músicas clássicas e românticas já deveriam estar sendo tratadas como material referencial e histórico, do mesmo modo que as músicas barrocas e renascentistas são tratadas: assim, teríamos um foco maior na música contemporânea, teríamos um repertório mais rico e menos monótono, e prezaríamos por uma maior compreensão daquilo que foi o século XX e do que está acontecendo no século XXI em termos de música erudita – Zappa, lógico, estaria relacionado; Stravinsky, por exemplo, já seria tarimbadamente tratado como uma espécie classicismo moderno...
4 comentários:
Bom ver que também busca explorar as sonoridades esquecidas da música erudita contemporânea, que a mim muito interessam. Como ocorre com a free music e o instrumental, esse segmento também permanece ignorado e marginalizado.
Sobre Cage e Feldman: diferente do que possa parecer, suas peças não são, de um modo geral, intrinsecamente dependentes de conceitos/contextos intelectuais para serem apreciadas. Feldman, trabalhando no intervalo de som e silêncio, criou pequenas jóias (veja “For John Cage”, para piano e violino, e ‘Three Voices”, para soprano) abertas às pessoas com sensibilidade sonora. Feldman (que foi professor do Fred Lonberg-Holm (do Vandermark 5) e da Joelle Leandre) e Cage nunca foram dos compositores mais cerebrais, como são o Brian Ferneyhough e o citado Pierre Boulez.
No caso de Cage, ‘4:33’ é apenas um fragmento de seu trabalho, que tem um papel muito mais relevante como ‘happening’, um gestual vanguardista último. Ouça suas peças para piano preparado, quartetos de cordas, mesmo sua ‘Music of Changes’.
É claro que nada disso é simples, assobiável ou agradável, como não o é a poesia de e.e. cummings, os labirintos prosaísticos de Joyce ou o cinema de Vertov. Mas não é para isso que essas expressões artísticas brota(ra)m...
à espera dos próximos posts sobre esse universo sonoro!
abs,
Sim, Fabrício, gosto muito de música erudita! Na verdade minha formação inicial foi erudita: iniciei na música aos 13, estudando violino. Até a idade dos 22 anos, por aí, eu escutei muita coisa de barroco, classico e romantico. De uns quatro anos para cá estive interessado em ouvir coisas novas, coisas do século XX e do nosso tempo, do nosso século, já tendo uma pá de compositores como favoritos: adoro Bernstein, Ives, Copland, Schnittke, Zappa, Wynton Marsalis (sim, ele é um dos maiores compositores contemporâneos em ascensão no universo erudito), Stravinsky, Messiaen, Penderecki e alguma coisa de Boulez e Stockhausen, dentre outros. E digo: eu disse isso de Cage e Feldman não porque eu não os ache relevantes, mas porque, definitivamente, existem críticos que estigmatizam suas obras com essas conceitualizações pedantes. Aliás, como bem sabes, são duas as obras mais citadas de Cage: a peça-happening "4:33" e o Concerto para Piano Preparado. Não sou fã do Cage, mas lembro que tem um CD dele que gosto: Works for Percussion. Sobre Morton Feldman, digo que sua música é monstruosamente feia: ainda preciso deixar essa impressão de lado e ouvir mais coisas. Boulez é outro que tenho uma certa seleção: nem tudo dele eu gosto.
Grato por seus comentários! Vamos trocando figurinhas, então, sobre esses vastos universos inexploráveis!
Abraços!
Pitta, interessante conhecer sua lista de favoritos na seara erudita: ela denuncia seu percurso auditivo e se mostra bastante coerente com sua leitura do campo jazzístico e instrumental.
Eu percorro trilhas paralelas e destaco dentre os que mais aprecio Anton Webern, Luigi Nono, Luciano Berio, Stockhausen, Scelsi, Galina Ustvolskaya e (para não dizer que nenhum dos nossos bateu) Penderecki. Aproveito e pergunto se gosta de todo o Penderecki, mesmo suas ousadias e radicalidades das décadas 50-70, ou se prefere mais suas (belíssimas) incursões por uma nova tonalidade dos 80 para cá?
Não é uma lista fechada, citei apenas alguns. É claro que através do jazz fui sendo preparado para ouvir essa música contemporânea com certas intrincÂncias instrumentais... Mas gosto outros tbm, ligados ou não ligados ao virtuosismo: gosto de de paixão de Ligeti, Shostackovitch, Bartok, Britten, estou pesquisando Golijov...vários outros. Dentre os que vc citou, por exemplo, já aprecio muito as aventuras de Luciano Berio: sua "Sinfonia", "Epifanie", "Folk Songs", dentre outras obras para vozes, que é onde ele se destaca.
Penderecki? Dele gosto de quase tudo, até do seu primeiro periodo, porque ele sempre buscou um certo grau de expressividade melódica e sentimental que não consigo encontrar em Boulez, por exemplo (Boulez é muito serial, pontilhista, ou seja, explorou muito essa coisa de colocar séries pra todos os elementos da música, isolar os sons em espaços largos, essa coisa toda muito conceitual). Gosto especialmente do concerto para violino de Penderecki (que, se não me engano, é uma obra onde ele já começa rumar de volta para uma certa "atonalidade melódica", ou seja, essa "nova tonalidade" que citaste)...gosto tbm dos novos concertos para clarineta, cello...esses já bem próximos de Mozart: ele, nas últimas décadas, tem adotado um discurso musical muito classicista - porém, mesclando tonalidade com atonalidade, como se quisesse ser uma espécie de "Mozart atonal"...bem é sempre difícil explicar isso, mas talvez me entenda...hehe
Abraço.
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