Definido pelo guitarrista Stanley Jordan como um dos "melhores contrabaixistas do mundo", Dudu Lima é um dos nomes mais importantes da atual cena instrumental brasileira. Seu senso criativo, aliado a um ouvido produtivo, faz com que o músico seja reconhecido e requisitado para tocar nos principais festivais do Brasil e do Mundo.
Quem esteve no Rio das Ostras Jazz & Blues Festival viu a apresentação marcante de um artista em puro momento de inspiração, revelando um músico que sabe o que está fazendo. Se há uma definição para a sua música – se é que isso seja possível –, me arrisco a dizer que é "colorida" e reflete com competência a alma e a essência de Minas Gerais, um estado conhecido por sua diversidade geográfica, cultural e racial.
Aliás, Minas Gerais, que sempre revelou personalidades ilustres, como Santos Dumont, Carlos Drummond de Andrade e Pelé, que encantaram o mundo exibindo criatividade e genialidade, hoje pode se orgulhar de Dudu Lima, um mineiro de "mão cheia" que faz da sua arte, sua história. Ou seria o contrário?
Dudu Lima, atenciosamente, nos concedeu esta entrevista exclusiva , onde falou do começo da carreira, da parceria com o guitarrista Stanley Jordan e sua participação no Festival Tudo é Jazz de 2008.
JazzMan!: Você começou a tocar baixo acústico muito jovem. O que foi que te influenciou a ponto de despertar o desejo de ser músico?
Dudu Lima: Foi um verdadeiro chamado, pois de repente comecei a apreciar o som do contrabaixo nas músicas. Eu tive sorte de ter em casa pessoas que ouviam sons de qualidade, apesar de não tocarem. Um dia estava assistindo a um show e tive a forte sensação que tinha que tocar o contrabaixo. Comecei tocando o elétrico e em seguida já veio o acústico que sempre me atraiu.Tive a sorte de ter ouvido essa voz bem novo e de obedecê-la e é a mesma voz que me convida até hoje!!! Espero que ela nunca pare de me chamar para esse universo tão especial que é a Música!!! Junto com o meu primeiro contrabaixo ganhei uma fita de vídeo com um show do Jaco Pastorius e isso foi decisivo para o minha visão do contrabaixo como um instrumento de possibilidades ilimitadas. Em seguida conheci Eddie Gomez e Ron Carter o que me trouxe a paixão pelo baixo acústico.
JM: Você já formou grandes parcerias com músicos brasileiros e estrangeiros, além de se apresentar em grandes festivais no Brasil e no mundo. Quais momentos mais significativos você destacaria em sua carreira?
DL: Eu destacaria aquele momento inicial que foi o responsável pelo amor pela música e a vontade de tocar. Ele foi o responsável por todos os outros que vieram.
Dentre esses momentos posteriores já na vida profissional eu destacaria a formação do meu primeiro trio, a convivência com grandes músicos em uma casa de Jazz em Juiz de Fora que é minha terra natal; (essa casa se chamava Jazz Club), a gravação de meu primeiro CD solo (Regina), o encontro com os meus parceiros musicais que são tantos que seria injusto citar nomes, além dos encontros musicais com Hermeto Pascoal que gravou no meu CD Nossa História e do trio com Stanley Jordan e Mamão(Azymuth)
JM: O guitarrista Stanley Jordan disse que você "está entre os melhores contrabaixistas do mundo". Como surgiu essa parceria?
DL: Eu comecei a tocar com o Stanley em 2001 no Visa Jazz Festival na cidade de Búzios. Ele veio tocar no festival e queria uma banda brasileira. O produtor Mauro Afonso (produtor musical que atua no Rio) encaminhou meu material para o Stanley e depois veio a notícia de que eu tinha sido escolhido.
Já no primeiro encontro para os ensaios que fizemos em Búzios a energia foi mágica e o som fluiu de uma forma maravilhosa. Assim, vieram as outras tours e hoje já fizemos nesses 7 anos quase 130 shows em altíssimo astral.
O Stanley é uma pessoa maravilhosa além de ser um músico genial e eu fico muito feliz com essa amizade e relação musical que temos. Ele participou do meu último CD e DVD ao vivo e eu e o Mamão participamos de seu novo CD que foi lançado esse ano nos EUA.
JM: Durante seu show no Rio das Ostras Jazz e Blues Festival, reparamos algo em comum com Stanley Jordan: a maneira percutida de tocar baixo, assim como ele faz com a guitarra. Fale-nos um pouco dessa técnica.
DL: Essa técnica é o tapping onde tocamos o instrumento de forma bem percussiva e o Stanley teve o mérito de codificá-la para o jazz de uma forma ímpar. Eu já era pesquisador do uso do tapping no contrabaixo e com esse contato tive a oportunidade de entrar nesse universo do Stanley de perto e isso me influenciou de uma forma muito forte. Aí tive a idéia de também utilizar o tapping no contrabaixo acústico o que gerou uma sonoridade bem interessante. Sem dúvida o uso do tapping gera outras possibilidades a nível de fraseado e de desenhos rítmicos o que enriqueceu muito as sonoridades que exploro.
JM: Você está para lançar o CD/DVD "Ouro de Minas", com composições de Milton Nascimento e João Bosco. Quais as diferenças que você enxerga entre esse novo álbum e os anteriores? Qual a importância desses compositores para sua carreira?
DL: A influência e importância desses compositores é muito grande, pois além do fato de ser mineiro sou fã da música mineira e ela me acompanha desde a infância. Ano passado, quando estava finalizando o CD e DVD 20 anos de pura música ,onde gravei "Clube da Esquina 2", eu percebi a grande quantidade de músicas mineiras que fazem parte do meu repertório de shows e visualizei este novo projeto, o qual batizei de "Ouro de Minas", pois verifiquei que isso era ouro puro e me dediquei a selecionar as músicas para o trabalho.Como tinha várias leituras para músicas do João Bosco resolvi convidá-lo para participar do CD e DVD e o resultado foi maravilhoso. O João Bosco é um músico da pesadíssima e nos brindou com uma participação genial na faixa "O Ronco da Cuíca". Em seguida selecionei músicas de outro gênio que é o Milton Nascimento, além da belíssima "Nascente" de outro grande compositor mineiro que é o Flávio Venturini. Além dessas músicas inclui 2 autorais inéditas e uma parceria minha com o Ricardo Itaborahy que é o pianista do meu trio e um grande parceiro musical.
A diferença desse material para o anterior é o formato que gravamos que foi ao vivo, porém sem público, já que o CD e DVD anterior foi gravado ao vivo e com público. E é claro que o momento diferencia os trabalhos já que a música que fazemos é espontânea e corresponde ao pensamento atual e com todas as idéias e inspiração que o cercam.
JM : Nos últimos anos, tem havido um grande debate a respeito da questão de direitos autorais, principalmente no que tange ao compartilhamento de músicas na internet. Enquanto artista de música instrumental, você acredita que isso ajuda ou atrapalha?
DL: Eu acho que a internet ajuda enquanto veículo de democratização do acesso às obras de todo o universo musical mundial. O que ainda não encontramos é a forma de controle pelos compositores da arrecadação de direitos autorais. Outro problema que percebo é com relação a poesia que representa a capa de um disco(seja vinil ou CD) e todas as informações nela contidas como os músicos que estão tocando e outros detalhes técnicos que são de suma importância para a obra.
No entanto, acho que essa estrada está sendo trilhada e não temos como interromper a caminhada. A solução é encontrar caminhos para não esquecer dos direitos autorais, pois a obra é o bem mais precioso do compositor e também não limitarmos o acesso ás mesmas já que a música é para ser ouvida por todos.
JM: Por fim, vamos falar sobre o Festival Tudo é Jazz. Enquanto músico, o que você acha de termos no Brasil um festival deste porte, que busca dar acesso à boa música, e o que o público pode esperar do seu show?
DL: Eu acho fundamental para o universo da boa música a realização de eventos desse porte em um país tão musical como o nosso. Precisamos difundir a cultura musical ligada à boa música e precisamos conquistar ouvintes e a melhor forma é a realização de festivais onde levamos a música viva literalmente para as pessoas.
É muito importante que cada vez mais esses exemplos de Rio das Ostras e Ouro Preto sejam seguidos como já está acontecendo em alguns locais como Ibitipoca, Ipatinga, Guaramiranga e tantos outros festivais que se realizam pelo país afora. Tomara que a idéia sempre se multiplique.
O público pode esperar um show com muita energia e muita criação que são as marcas registradas do meu trabalho. Para mim é um prazer muito grande participar de um evento como esse e tenho certeza que o pau vai quebrar!
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